- APRESENTAÇÃO -

O objetivo deste Blog é divulgar projetos, pesquisas, trabalhos, textos que abranjam o pensamento filosofal de diversas áreas e diversos pensadores, disponibilizando-os a quem assim quiser partilhar e precisar para suas próprias investigações e pesquisas. Grato a todos que me ajudaram: Professores, Tutores e Colegas.

terça-feira, 16 de março de 2010

A ÉTICA MODERNA E SUA CRÍTICA

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
CAMPUS – EAD – LONDRINA-PR
Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião
Filosofia Licenciatura



AGUSTAVO CAETANO DOS REIS



FUNDAMENTOS DA ÉTICA E DA FILOSOFIA POLÍTICA
A ÉTICA MODERNA E SUA CRÍTICA














SÃO BERNARDO DO CAMPO-SP
2009
AGUSTAVO CAETANO DOS REIS
Nº 161062






FUNDAMENTOS DA ÉTICA E DA FILOSOFIA POLÍTICA
A ÉTICA MODERNA E SUA CRÍTICA








Trabalho apresentado ao módulo: Fundamentos da ética e da filosofia política, à disciplina: A ética moderna e sua crítica. Em cumprimento às exigências do curso de Licenciatura em Filosofia, da Faculdade Metodista de São Paulo - Pólo Londrina.

Professor: Daniel Pansarelli







SÃO BERNARDO DO CAMPO-SP
2009
SUMÁRIO


1 – INTRODUÇÃO.............................................................................................03

CAPÍTULO 1
A RELAÇÃO ENTRE RAZÃO, ÉTICA E POLÍTICA EM ARISTÓTELES...................................................................................................05

CAPÍTULO 2
A RELAÇÃO ENTRE RAZÃO E MORAL NA MODERNIDADE.................09

CONCLUSÃO.....................................................................................................13

REFERÊNCIAS..................................................................................................16

































INTRODUÇÃO

A proposta que se apresenta é assustadora e ao mesmo tempo maravilhosa: passear pelos grandes pensadores do vulto de Aristóteles, Kant, Nietzsche e dos atuais é um risco de sanidade e concomitantemente um prazer profundo e ímpar. Uma possibilidade que poucos têm de poder desbravar.
Busca-se com o primeiro capítulo deste texto, apresentar uma relação entre a razão, ética e política sob o ponto de vista de Aristóteles, estudando trechos de seu livro “Ética a Nicômaco”, e outros textos de apoio.
No segundo capítulo há uma breve apresentação entre razão e moral na Modernidade, vista depois de se beber textos maravilhosos de grandes pensadores do porte de Kant e Nietzsche.
Muitos podem buscar apenas detalhes que ligam ou que desconectam este ou aquele autor, mas a ideia que permeia este trabalho é uma tentativa de ilustrar as opiniões que favorecem uma postura para os tempos atuais, onde deveria existir uma unidade entre ética e política, muito embora o distanciamento com a Antiguidade seja grande, mas, como se buscará demonstrar, talvez apenas pelo tempo, pois fatores éticos e morais na política sempre foram o mote de todos os gênios da Filosofia, tanto antiga quanto moderna. Afinal, o bem maior, o bem comum continua sendo a felicidade.
Na modernidade todos querem agradar dizendo “sim”, acolhendo os absurdos da ilusão, algo inviável e não funcional. A sombra oculta por trás disso tudo pode ser identificada por um nome: medo! Um espírito que é livre torna-se o que é e tornar-se o que é seria a reunião de afetos de comando necessários para essa elevação. O espírito seria uma “construção”, uma estilização de experiências e vivências. Acreditam-se que na Modernidade a política é decadente, pois cabe aos espíritos mais seletos a obra de realizar-se, fazerem-se criadores, espiritualizar-se. Nossa política/justiça não pune com a intenção de correção , mas simplesmente pelo prazer e afirmação de autoridade.
A sugestão seria ter amor ao necessário e esse necessário seria na visão de Nietzsche “tornar-te o que és”: acima de tudo, “ama-te como és”, ou como diria a sabedoria popular: “Cuida de ti!” O Professor Nobre ressalta que “o ‘torna-te o que és’ é, antes de tudo, um mote de ‘distinção’; é o correspondente positivo do: ‘Não sigas por onde vai um outro.’”
O que se busca com o resultado do trabalho é colocar uma sugestão, uma proposta de que o grande diferencial na ética, moral, razão, política é a experimentação de uma nova necessidade, superando-se a moralidade escrava, “libertar para criação”. Kant (assim como Aristóteles) acreditava que o ser humano esta fadado a viver num ambiente social e político e para tal precisa fazer uso da razão para conviver com os demais, “civilizando-se” nessa sociedade e esse caminho seria a educação cujo objetivo é a moralização que, por sua vez molda, forma o caráter do ser humano. O homem sem regras não inspira confiança é uma pessoa que não sabemos como lidar. Pode ter reações imprevisíveis e livres de toda e qualquer lei ou norma de conduta, chegando a beirar o conceito de loucura.
As características que se observarão no texto são de que precisamos ter em conta que cada um é individualmente inédito. Tratar as pessoas como a medicina que atribui remédios em massa que são universais pode ser um equívoco. O ser humano acredita que as convenções e conceitos da Modernidade são verdades inabaláveis, dogmas pétreos e ao citá-las não percebe que está mentindo inconscientemente.
Não se quer com o texto valorar este ou aquele, como já dito, Kant quis trazer potência à razão, e Nietzsche quis transvalorar as convenções. O que se buscará expor – da compreensão dos textos lidos – é que existe uma maneira limitante de pensar e é exatamente no uso frágil da razão que se encontram os grilhões da liberdade. Essa ruptura com o universal pasteurizado e que nos leva a desconfiar de nossas avaliações atuais é uma seta que indica um Norte: o domínio de si, ou seja, crítico de si próprio.

















CAPÍTULO – 1

A RELAÇÃO ENTRE RAZÃO, ÉTICA E POLÍTICA EM ARISTÓTELES

Realizar uma dissertação sobre o trabalho de alguém já não é tarefa grata para pessoas devidamente habilitadas. Realizar uma dissertação sobre o trabalho de um alguém do vulto do grande Aristóteles não é tarefa grata para muitos, em especial para incipentes neófitos à Filosofia... Como lançar uma opinião sobre temas tão profundos e de ordem social tão importantes quanto razão, ética e política? Necessário se faz ter uma base e minha base é singela e pífia para querer demonstrar conhecimento sobre a temática. Todavia, procurarei esboçar uma opinião fundada em textos me ofertados e pesquisas realizadas.
Aristóteles precisava sair do mundo das ideias para o mundo concreto, onde pessoas de carne e osso viviam, sentiam, amavam, guerreavam, comercializavam. A polis crescia e com ela a necessidade de uma vida em comum a necessidade de reger a vida do cidadão para que o cosmos pudesse reinar era imprescindível. Para tal a mente brilhante de Aristóteles fremia de pensamentos que trouxessem a ordem e evitasse um caos.
Para isso não bastava unicamente nascer e ser um fruto do divino, mas sim manter-se reto e dedicado em um foco, uma meta, cujo objetivo era ser o exemplo vivo de sua obra viva. Como postular aos demais que compreendessem suas posturas e seus ensinamentos se ele mesmo não vivesse de modo a corroborar suas colocações? Ora, se não nascemos virtuosos, tal capacidade necessita unicamente de nossa postura, pois, segundo destaca o Professor Paulo Ferreira da Cunha em seu texto “Aristóteles – Filosofia do Homem, Ética e Política”, “As virtudes estão assim nos homens [...] em potência” (CUNHA. 2003). Ou seja, é colocando em prática a própria virtude que se alcança cada vez mais e mais os degraus da mesma. Isto, porém, só pode ocorrer quando se sabe o que se faz e para tal é necessário valer-se do uso da razão! Um exemplo do Professor que abrilhanta seu texto é o do paciente que não pode se curar apenas e tão somente concordando com o diagnóstico médico sem dar conta das receitas lhe indicadas para o tratamento. É ilógico.
É por isso que Aristóteles foi considerado o primeiro sistematizador das coisas políticas (dentre outras, como um estimável pedagogo sociólogo, fundador do direito constitucional com seus diferentes ramos, histórico, nacional, geral e comparativo; que criou a ciência política no sentido de que, estabelecendo a dinâmica e medindo o rendimento das instituições, ela ultrapasse o direito). (ATEUS.NET). Sua visão era a de que a natureza humana era exclusiva, senão necessariamente uma natureza social e política, com dimensões irrecusavelmente jurídicas. O Homem é um ser da cidade, um animal político.
Aristóteles raciocinou concluindo que cidadão, em suma, seria o homem, mas não apenas por sê-lo, mas sim o politicamente ativo. E diferenciava essa condição ativa dos demais trabalhadores. Por exemplo, um artesão não poderia ser um autêntico cidadão, eis que não poderia ser um político ativo, ou melhor, não encontrava tempo suficiente para dedicar-se à cidadania política, tendo em conta que precisava cuidar de suas tarefas profissionais.
Mas o que conduziria uma pessoa a rumar para as questões de ordem ética e política? A mola propulsora seria a felicidade! Essa felicidade que Aristóteles não compreendia no acúmulo de riquezas ou bens externos – muito embora os considerasse úteis – mas sim o que realmente valia: a inteligência, costumes excelentes, os bens da alma. Ora, a felicidade pública não difere da felicidade privada, em assim sendo, conclui-se que na política, o homem deve encontrar-se feliz, mesmo sem riquezas, apenas com “os bens da alma”. Que exemplo para os políticos de hoje! E isso fica claro em sua “Ética a Nicômaco” quando ele destaca que “[...] a política utiliza as demais ciências e [...] legisla sobre o que devemos e o que não devemos fazer, a finalidade dessa ciência deve abranger as das outras, de modo que essa finalidade será o bem humano”. (ARISTÓTELES. p. 49; 2; 1094b; 5). (Grifo meu).
De nada vale teorizar sobre isso sem a razão, base para os frutos a serem colhidos – ou o único fruto: felicidade. Cito outro trecho da obra “Ética a Nicômaco” que traz luz ao exposto:

[...] o defeito não depende da idade, mas do modo de viver e de seguir um após outro cada objetivo que lhe depara a paixão. A tais pessoas, [...] a ciência não traz proveito algum; mas aos que desejam e agem de acordo com um princípio racional o conhecimento desses assuntos fará grande vantagem. (ARISTÓTELES. p. 50; 3; 1095a; 5 e 10). (Grifo meu).

Nesse sucinto e brevíssimo trecho encontra-se a alma de dois dos pontos necessários à vida na polis politizada: “princípio” e “racional”. A ética e a razão espelham-se no Homem da polis, no homem da política que busca o bem do próximo sem pensar em extrair proveitos de sua atividade. Outros confiam no legislador e querem o melhor para si e para os seus, por tal imagina-se que os que elaboram leis para serem cumpridas sejam exímios conhecedores de virtudes e praticantes das mesmas. Hesíodo já dizia:

Ótimo é aquele que de si mesmo
[conhece todas as coisas; Bom, o que escuta os conselhos
[dos homens judiciosos.
Mas o que por si não pensa, nem
[acolhe a sabedoria alheia,
Esse é, em verdade, uma criatura [inútil.
(ARISTÓTELES, p. 51. 4. 1095b, 10).

A virtude, para Aristóteles estava acima da própria honra e ela em si mesma seria a finalidade da vida política. Nem todos os fins são absolutos; mas o sumo bem é claramente algo de absoluto. Esse era o conceito que ele fazia da felicidade, a auto-suficiência, aquilo que em si mesmo torna a vida desejável e carente de nada e a finalidade da ação, do Homem de ação, do animal político, da Política em si.
Mas isso é um objeto de escolha, da ética, do princípio inato. A política não pode - e não deveria – se converter em objeto de prazer, não poderia se tornar mais desejável do que o bem comum; não que não se possa encontrar prazer no ato de politicar, mas esse prazer então deveria ser completo, em todo e qualquer momento, pois assim esse prazer seria cabal e perfeito na “atividade”. Infelizmente o próprio Aristóteles concorda que “todos os seres humanos são incapazes de uma atividade contínua, e essa é a razão de não ser contínuo também o prazer, pois ele acompanha a atividade”. (ARISTÓTELES, p. 224. 4, 1175a, 5).
O Professor Cunha tem sua própria posição a respeito e, ao que parece, Aristóteles também chega a esse corolário: “[...] a vida virtuosa pode ser mais ativa ou mais contemplativa. E aí não há unanimidade entre os que louvam a virtude em geral”. Por isso há diferenças, e ele completa com Aristóteles:

Uns não dão nenhuma importância aos cargos políticos e consideram a vida de um homem livre muito superior à que se leva na confusão do governo; outros preferem a vida política, não acreditando que seja possível não fazer nada, nem portanto ser feliz quando não se faz nada, nem, que se possa conceber a felicidade na inação. [...] Uns e outros têm razão até certo ponto e se enganam sobre o resto. (CUNHA. 2003)

Penso humildemente que se o homem é um animal político, não importa se um artesão, um militar, ou um filósofo, todos somos e temos o direito de politizar, diria mais, a obrigação, eis que todos esses elementos estão envolvidos numa busca, seja essa busca contemplativa ou ativa, consciente ou não: a felicidade, que é, na ótica de Cunha “tanto nos particulares como nas sociedades políticas, fruto de uma ação ponderada, previamente refletida. De uma ação fruto da virtude, e de uma virtude pensada.” (CUNHA. 2003). (Grifos meus). E isso na contemporaneidade não se alcança meramente fazendo uso do voto.
Façamos um jogo de palavras para fechar esse trecho.
Se a felicidade é a expressão do bem e o bem é a finalidade de todas as coisas, então a felicidade é o fim de todas as coisas. Bem, se a razão é o caminho para o bem (felicidade), logo a razão é o caminho para a felicidade e todas as coisas. E, o homem tem como função dele mesmo o caminho para o fim de todas as coisas. Se a felicidade, ou seja, o fim de todas as coisas tem sua excelência no intelecto e o homem é o intelecto, logo podemos concluir que a felicidade está no homem!




















CAPÍTULO 2

A RELAÇÃO ENTRE RAZÃO E MORAL NA MODERNIDADE

“Dependendo das respostas que obtivermos, em cada sistema filosófico, há um mundo possível a ser vivido.” Assim dizem os Professores Sardi e Müller em seu artigo “Questões que afetam nossa vida” (SARDI; MÜLLER. 2009, p. 01). Hoje, com a quantidade de material que temos acesso dos grandes pensadores da antiguidade e da contemporaneidade, fica complexa a elaboração de uma opinião formada sem cairmos na tentação de defender este ou aquele. “Nas questões filosóficas é a existência que se põe em decisão. Por isso é preciso refletir sobre as nossas potências, sobre os nossos limites, sobre o próprio ato de conhecer.” (SARDI; MÜLLER. 2009, p. 01). Nietzsche parece querer nos preencher com isso, com o próprio ato de conhecer. Sem o conhecimento não há possibilidade de sequer iniciar-se um questionamento. E o conhecimento só é intelectível através da razão e o questionamento seria a busca pela verdade, caminho que o próprio Nietzsche nunca abandonou e que os Filósofos atentos também trilham.
Entretanto, para Nietzsche o intelecto era fugidio, transitório e com um horizonte muito limitado, ele nada mais era do que um elemento fingidor que oculta, ilude, dissimula, forja, tudo com o fito de esconder um fundo trágico e assim, enganando o indivíduo intelectualóide, continua vivendo. Para Nietzsche o homem de verdade deveria escapar do rebanho social que enquadra e molda a forma de viver. A forma é a fôrma que nos molda. Mas escapar dessa conduta bitolada é um risco, um perigo, tal como uma rês que escapa ao abate: causa problemas! Dizer a verdade (mesmo que autônoma) é algo subjetivo e tergiversado, a verdade do indivíduo passa pelo seu intelecto, por sob sua ótica pessoal e assim, ao ser exprimida, nada mais é do que uma alteração do real, por tal, como a rês que escapa, causa tumulto.
A verdade que se busca dizer hoje em dia – e quiçá também em outrora – e que enche os consultórios de psicanalistas e psicólogos, é sempre dita através da palavra ou da escrita – experiência de outrem - e nesse momento tudo o que o pretenso auxiliar da mente alheia pretende, ingenuamente sob o pálio de ajudar, é fazer com que o “paciente” compreenda a si mesmo através da sua própria visão de médico, do próprio entendimento pessoal do profissional da área “patológica” e não encontrar a vivência pessoal, individual e íntima; assim como Nietzsche preconiza: “[...] o homem mais arrogante, o Filósofo, imagina ter também os olhos do universo focalizados, como um telescópio, sobre suas obras e seus pensamentos.” (NIETZSCHE. 1975, p. 17). (Grifos meus).
O que o ser humano quer nada mais é do que uma “razão” para defender sua “moral” e assim vive de dia como de noite, se enganando através de sonhos sem que o seu sentido moral jamais tente impedi-lo pois é covarde ou medroso, sempre ditado pela forma interna que leva a desculpa chamada “consciência” ética ou moral. Tudo para continuar a ser o animal-político, ou a rês da vez. Assim, ele se pergunta: “[...] haveria no mundo um lugar de onde pudesse surgir o instinto da verdade?” E a resposta pode ser sim! Na transvaloração, no pensamento abismal, na ideia de eterno retorno, ou melhor ainda, o que culmina em Nietzsche ainda em uma ética, eis que o eterno retorno é um pensar ativo, um desejo, uma vontade, uma leveza, um prazer de se viver intensamente cada instante, sentindo acontecer um traço característico do que se é (NOBRE, 2006, p. 191).
Kant defendia a moral de forma tal que o homem precisaria dela para aprender a ser um homem e atribuía a não ausência de liberdade, mas sim uma responsabilidade por ela, mas sempre vinculado a um agir precedente de uma lei moral. Kant vai mais longe quando afirma que “se pode fazer a razão objetivamente prática também subjetivamente prática.” (OLIVEIRA. 2006, p. 70). À época de Kant, para ele, a ética se dividia em ética pura e a antropologia prática ou moral, ou seja, o direito e a educação como forma de moldar o caráter da pessoa. Como já dito, a forma é a fôrma que nos molda, molda na forma que é preconcebida pelos conceitos morais e cívicos, pela educação construída para enganar e calar a boca dos “olhos que tudo vêem”, a moral. Mas quem, pergunto-me, na ordem do dia, teria o condão de saber o que é moral e ético nos dias de hoje? Na América do Norte, na China, no Vietnã, na Alemanha, no Paraguai, no Brasil, na “minha” cidade, na “minha” casa? Talvez o poder, o poder financeiro. Quem ganha para o sustento teria o poder de ditar as normas e quem se submete a esse jugo, seja por conformismo, conforto ou medo, obedece. Onde estaria a liberdade, então? Na subjetividade. Os escravos quando libertos encontraram-se em situações horríveis, pois da noite para o dia, eram livres do jugo da cangalha e do chicote e ao mesmo tempo de um teto para se proteger das intempéries e do alimento para saciar a fome... Pontos de vista. Quem teria “razão”?
A vivência, a experiência são aspectos que flutuam tanto em Nietzsche quanto em Kant e em diversos outros pensadores equilibrados. Sem ela não há experimento, não há necessidade do intuir, calcular, normatizar.
Penso que Nietzsche não era um crítico de Kant, mesmo porque este também nunca negou o estudo empírico do homem na sua ética. Kant condenava outros moralistas que ignoravam a natureza humana: “[...] as pregações nos púlpitos são vazias em seu conteúdo, se o pregador não observa simultaneamente a humanidade.” (OLIVEIRA. 2006. p. 72). Nietzsche parecia demonstrar seu descontentamento com a “forma” como se defendia a moral como estandarte de uma polis politizada, civilizada, ordenada, presa, bitolada.
É importante frisar que existe uma espécie de cabo-de-guerra no interior do ser humano que não aceita e não quer expor sua “imoralidade”, talvez pelo receio de adorá-la, de gozar profundamente em seu secreto de instintos “animalescos” tidos como imorais. Instintos estes que ele tão forçosamente busca esconder como um pecado dos demais e de si próprio, com temor de que os conceitos morais construídos o excluam da sociedade, a exemplo de um Don Juan, de um Marquês de Sade, de uma Lucrécia Bórgia. O que separava Nietzsche de Kant não era a ideia de dever, mas sim a reinterpretação em um conteúdo anti-humanista e antiuniversalista. Onde Kant condenava o espírito e sua vontade ao universo genérico do humano como base de sua liberdade e pessoalidade, Nietzsche afirmava que o si próprio era um ato explicitamente egoísta em que não se busca o universal humano mas sim o particular cósmico (NOBRE. 2006. p.190).
Por tal, como vivermos numa modernidade onde tudo seria permitido? Em que mundo poder-se-ia viver assim? Existem pesquisas ufológicas – e aqui quero entrar num campo com grandes parênteses – que dizem existir raças espaciais que desconhecem os sentimentos e por tal agem sem remorsos, sem o fator “consciência”. Se assim o é, seria possível vivermos assim no singelo Planeta Terra? Devemos buscar o universal humano ou o particular cósmico? Não seria melhor àqueles ditos seres conscientes, repletos de phatos, que buscassem o “particular” para só então nos solidarizarmos com o “humano”?
Um cachorro ataca um gato e aquele chacoalha este até sua vida extinguir-se; então larga os restos para trás e, com sua cauda balançando parece demonstrar alegria em ter cumprido sua missão instintiva enquanto se afasta. Nós somos ditados pela supressão, pelo enquadramento moral e ético, desse mesmo impulso instintivo e damos a isso no nome de consciência...
A grande “sacada” de Nietzsche é a experimentação de uma nova “necessidade”, ligada à superação da moralidade escrava: a necessidade da liberação para criar, e talvez assim ser taxado de imoralista. Como meio de conservar o indivíduo na sociedade, o intelecto, a razão age só que se vale da dissimulação que gera a ilusão. À nossa volta, a natureza não dissimula nenhuma das coisas, o homem debilmente se entrega apegado aos prazerosos sonhos atrativos de um “segredo” qualquer.
É preciso regras as quais funcionem e que sejam conscientemente seguidas para se viver, em especial na polis. Caso contrário, o caos humano se instala e tudo vira anarquia. Mesmo um ermitão na fuga solitária de sua caverna distante e oculta precisa de uma rotina a seguir, um método para viver bem, ele sabe onde e quando colher, pescar e caçar; sabe onde defecar e certamente não o fará no interior de seu reduto, eis que sequer um animal o faria.
A própria Terra gira, metodicamente, numa sincronia espacial e numa órbita que chamamos de “sistema” solar. Se um dia ela inventasse de deixar seu compromisso galáctico e parar de girar, simplesmente pelo fato anárquico de fazê-lo, será que gostaríamos? O problema não está na moral ou na ética imposta pela política moderna mas sim na sua forma corrompida e contaminada. “Afirmar incondicionalmente a vida, com toda a maldade, incertezas, experimentações e perigos que lhe são inerentes, é a condição niestzschiana para a criação de novos valores. E o grande valor é a criação de si mesmo.” (NOBRE. 2006. p. 196.)






















CONCLUSÃO

Tanto Nietzsche quanto Aristóteles viveram o que postularam sob seus aspectos até mesmo radicais. Aristóteles terminou por romper com Platão e Nietzsche praticamente com seus amigos todos. Mas ambos fizeram história ao trazerem à lume suas opiniões revolucionárias sobre ética, moral, política, razão e felicidade.
Aristóteles verificou a necessidade de o homem ser feliz através de normas e éticas morais que adviriam de pessoas conscientes as quais conduziriam os demais através de uma política correta. Nietzsche também busca o homem perfeito, mas através de uma nova ordem de questionamentos que quer erradicar do indivíduo o conformismo com as rédeas de um poder contaminado.
Na visão do Filósofo estagirita, na sua ética ou na sua política um bem deveria contribuir para um fim profundamente humano: a felicidade, esse deveria ser o primeiro pensamento dos legisladores. Contudo, parafraseando o Professor Cunha, mesmo na nossa sociedade moderna encontramos pessoas de perfis psicológicos que são adeptas da auto-escravidão por natureza, mesmo estando livres.
Aristóteles, no final do Livro X de Ética a Nicômaco, esclarece que as constituições devem ser elaboradas pelos pensadores atuais de forma que se examinadas observem-se as espécies de influências que elas exercem, ou seja, quais preservam o Estado e quais as destroem, por que algumas são bem aplicadas e outras não. Com isso em vista, ter-se-á uma perspectiva de quais leis (através dos costumes locais) convém utilizar a fim de ser a melhor possível.
Nietzsche participava da opinião de que cada um deveria inventar para si a sua virtude e o seu imperativo categórico, o que não foge muito da que postulava Aristóteles acima destacado, qual seja, uma lei deve ser apoiada na ética e na moral de seu povo. Na modernidade já há não muito espaço para a criação. O que vale é a “lei” da cópia. Se funcionar em um lugar, deve ser universal. Mas não é bem assim. As cópias de leis devem ser analisadas, pesquisadas consoante os costumes do local onde serão aplicados. Temos em nosso um país um exemplo destoante desse tipo de cópia mal elaborada. O Estatuto da Criança e do Adolescente é uma tentativa moral e ética de se ordenar a vida dos jovens através de estatutos vindos de outro país e que não se adequaram perfeitamente à nossa nação onde, até hoje, opiniões divergem quanto ao fato de uma criança na faixa de seus 12 a 17 anos não ter nenhuma atividade que lhe oriente na vida, excetuando os estudos convencionais.
O ser humano usava seu intelecto a seu próprio favor, para seu bem; agora ele é escravo do intelecto que faz o que quer e engana o indivíduo para sobreviver, como um elemento denso agregado em seu espírito. Kant dizia “se a razão não quer se submeter à lei que ela se dá a si própria, tem de se curvar ao jugo das leis que um outro lhe dá”. (EUZÉBIO. 2007. p. 65).
Verifica-se que na modernidade o ser humano passou a ter suas percepções das coisas e da natureza restritas aos “retângulos”. Tudo lhe advém através de um livro, de uma revista, jornal, TV, monitor de um computador, ou seja, através da ótica experimentada, copiada, plagiada de uma pessoa para outra, sem o gosto do viver aquela informação cultural. Nietzsche era categórico a esse respeito. Inclusive no que se diz à observação do verdadeiro, da busca pela verdade. Essa não pode ser transmitida ao outro, sequer sermos um orientador para o curso da mesma, pois assim estaremos induzindo o próximo sob o meu ponto de vista já digerido e mastigado internamente. Contam as histórias bíblicas que quando Pilatos indagou a Jesus sobre a verdade este se calou; quando os discípulos indagaram a Buda sobre a verdade este deu as costas aos mesmos, aí está! Mesmo este insignificante texto pode querer demonstrar sabedoria e conhecimento, mas olho todo o material que pesquisei, o que li, os insights que tive ao me aprofundar em suas leituras, e todas minhas notas ao pé dos mesmos e percebo que não consegui transmitir tudo o que senti e vivi e acabo ficando com uma espécie de nó em minha garganta, uma vontade de dizer, de escrever mais, de tentar explicar a verdade que percebi, que captei. Mas assim estaria sendo um egoísta... E me pergunto: isso seria uma covardia ou um ato sábio de revolução? E mais, tudo isso é uma porção enganosa ou autêntica, levando em conta que o que “vivi” não passa de experimentos de outros?...
Acredito que todos busquemos a felicidade e a verdade. Qual seria então a moral, a ética, a questão religiosa que nos conduziria para uma mentira quando a verdade pode nos conduzir a resultados destrutivos ou perniciosos? Meu pai, no alto de seus 81 anos de idade, sempre me orienta: “Existem mil formas de se dizer uma coisa.” Estaria ele próprio me passando uma sabedoria da mentira, da manipulação das palavras, um falso amor? Ou deveríamos voltar a viver na “matrix” eis que Sião não promete a felicidade que se espera?
O Professor Nobre apresenta uma proposição: “A crença na origem não pode ser recuperada depois que se experimentou o desencanto com as tentativas de se conferir um sentido para a vida.” (NOBRE. 2006. p. 194).
Kant deposita sua fé na educação ao passo que Nietzsche busca uma liberdade louca como um “andarilho que sabe que, para avaliar sem preconceito os preconceitos morais, é necessário ‘abandonar a cidade’ e ‘ir para fora’ e ir ‘para cima.’” (NOBRE. 2006. p. 199).
Precisamos da inteligência nos tempos que vivemos, esta é a razão, pois se tudo é permitido dentro da busca pela verdade, pela liberdade e pela felicidade, implica uma razão lógica que nos conduza individualmente dentro do sistema conceitual em que vivemos que nos possibilite a possibilidade de visões e experiências outras.
Professor Nobre cita Fernando Pessoa em uma passagem poética de cunho auto-explicativo e com ela concluo este texto: “Todo mal do mundo advém de nos incomodarmos uns com os outros.”



























REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Danilo Di Manno de. Uma ética para o corpo. Cidadania e educação transformadora. Disponível em: Acesso em 2008.


ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Livro I e Livro X. [S.l:s.n.:s.d.] Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Ross.


_____. A política. Disponível em: Acesso em 17 maio 2009.

CUNHA, Mariana P. S. da. Sucedâneos à ética clássica: Reflexões sobre o agir humano e o além do homem nietzscheano. Disponível em: Acesso em 17 maio 2009.


CUNHA, Paulo Ferreira da. Aristóteles. Filosofia do Homem: ética e política. Disponível em: Acesso em 20 maio 2009.


EUZEBIO, Marcos Sidnei Pagotto-. Considerações acerca da Fundamentação da metafísica dos costumes de I. Kant. Liberdade, dever e moralidade. Disponível em: Acesso em 18 maio 2009.


NASCIMENTO, Rodnei. A política no mundo moderno: Autonomia da política em o príncipe de Maquiavel. Guia de Estudos. Ed. Universidade Metodista de São Paulo. São Bernardo do Campo - SP. 2009. 91 pp.


_____. Introdução à filosofia política: A unidade entre ética e política na antiguidade clássica. Guia de Estudos. Ed. Universidade Metodista de São Paulo. São Bernardo do Campo - SP. 2009. 91 pp.


NIETZSCHE, Friedrich. Verdade e mentira no sentido extramoral. Extraído de Oeuvres Philosophiques Complètes, I, 2, Écrits Posthumes: 1870-1873; Paris: Ed. Gallimard,1975, pp. 275-290. Tradução, apresentação e notas por Noéli Correia de Melo Sobrinho. Disponível em: Acesso em 17 maio 2009.


NOBRE, Renarde Freire. Nietzsche e a estilização de um caráter. Disponível em: Acesso em 20 maio 2009.


OLIVEIRA, Mário Nogueira de. Para inspirar confiança: considerações sobre a formação moral em Kant. Disponível em: Acesso em 20 maio 2009.
PANSARELLI, Daniel. Ética filosófica: conceito e origem. Guia de Estudos. Ed. Universidade Metodista de São Paulo. São Bernardo do Campo - SP. 2009. 91 pp.


SANTOS, Rosângela Firmino dos. Breves considerações em “verdade e mentira no sentido extra-moral” em Nietzsche. Disponível em: Acesso em 18 maio 2009.


SARDI Sérgio Augusto; MÜLLER, Felipe de Matos. Questões que afetam nossa vida. Jornal Mundo Jovem. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da PUCRS. Junho de 2009. Ano 1, número 3.

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